O empreendedorismo negro não se constitui como um fenômeno recente ou passageiro. Ele é, antes de tudo, uma expressão contemporânea de práticas econômicas, sociais e culturais profundamente enraizadas nas formas de organização comunitária do povo negro ao longo da história. Reduzir o empreendedorismo negro à lógica de “tendência de mercado” é ignorar o caráter ancestral e político que sustenta essa prática.
Historicamente, pessoas negras foram sistematicamente excluídas dos meios formais de produção, crédito e trabalho. Diante disso, o ato de empreender emergiu como estratégia de sobrevivência, autonomia e reconstrução de identidades coletivas. Desde as quituteiras, artesãs, lavadeiras e comerciantes das feiras até os empreendedores de hoje, há uma linha contínua que conecta o fazer econômico à resistência cultural e espiritual.
O empreendedorismo negro, portanto, é uma tecnologia social de reexistência. Ele não nasce apenas do desejo de prosperar financeiramente, mas da urgência de criar espaços de pertencimento, dignidade e afirmação. Cada negócio liderado por pessoas negras carrega em si a memória das ancestralidades que sustentaram famílias e comunidades quando o Estado e o mercado lhes negavam acesso e visibilidade.
Essa dinâmica ultrapassa a dimensão individual do “ser empreendedor”. Trata-se de um movimento coletivo que reposiciona o povo negro como protagonista da sua própria narrativa econômica. Ao empreender, pessoas negras resgatam saberes tradicionais, reconfiguram o consumo, e produzem inovação a partir das margens — transformando o que antes era ausência em potência.
Dizer que empreendedorismo negro não é tendência, é ancestralidade e resistência é reconhecer que esse movimento é parte da luta histórica pela vida, pela liberdade e pela construção de futuros possíveis. É compreender que o ato de empreender, nesse contexto, é também um ato político, afetivo e espiritual. Por isso, quando falamos em empreendedorismo negro, não estamos falando de uma tendência do mercado, e sim de uma prática ancestral que atravessa séculos.
A gente precisa colocar o processo histórico à frente de qualquer formato.